O vento continua, todavia. Este título, que move vigorosamente algo que em nós se orienta para a beleza, nos coloca diante do trabalho de dez poetas contemporâneos que vivem em Belém. Poetas em e não apenas de, como se poderia esperar numa antologia cujo critério de seleção parece ser inicialmente o local. Esse em não assinala somente a localização, o endereço de alguém em um determinado espaço geográfico, campo ou cidade, assinala também o modo próprio como esse lugar invade esse alguém, como p rogressivamente captura, chegando até os nomes, o lugar de origem. E, no fim, lançados num hibridismo, na mistura de raízes e galhos, copas de árvores, pássaros e luminosidades, nos deparamos com o que nos sobra: a linguagem e o amor. Só assim somos, nessa espécie de nudez na qual nos descobrimos, capazes de atravessar, com esses poetas, os ventos que sopram por toda parte: “vento no rosto”, “sons graves nos ventos”, “telhas de nuvens e paredes de ventos”, “fios de água com sons ao vento”, “vent o de areia”, “morfina do vento”, “tudo que o vento dispersa a guerra destrói”. Outra palavra que se repete aqui com insistência e se articula, de modo fino, com a palavra vento, é, como já poderíamos supor a partir do título, a palavra “voz”: “para e ntão fazer a voz avançar na direção / sul / do corpo […] no corpo em seu estado eólico / de sopro e harpa.” Mas a voz aqui também comparece sem qualquer possibilidade de afinação, anterior à palavra, e jamais capturada por ela. Essa voz, “peixe escur o na garganta”, pode ser a tempestade (“O poema é diminuto e a tempestade imensurável”) ou pode ser o “silêncio maciço”, “enigma, da superfície ao fundo, vulto / transparente atravessando o véu do tempo / […] círculo invisível em volta de seu próprio /mistério – eterno, terreno, intocável, aéreo.”.
São “dez vozes da poesia contemporânea em Belém”, são dez vozes muito singulares atravessadas pelo pertencimento a uma só cidade. O trânsito entre elas não é fácil, pois o “mais ligeiro embaralhamen to da voz / muda a poesia e o contexto”. Todo trânsito de uma voz a outra, com seu tempo intermediário de hibridismo, nos faz experimentar “mudanças sísmicas” ou, para usar as palavras de outro poeta, “o choque de placas tectônicas”. E, no entanto, s eguimos na leitura sem nos esquecer dos versos seguintes do poema: “onde as cartas indicam ilhas dispersas / o continente submerso se unifica”. Ao longo da leitura desses poemas, de uma leitura insistente, às vezes a favor, às vezes contra o vento, m