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O ridículo do estado atual do mundo é, desde sempre, um assunto recorrente entre satiristas. Em Momo Rei, Adriano Scandolara vislumbra uma dimensão metafísica para esse fenômeno.
Tudo começa com o deus Momo, filho da Noite, uma dessas div indades menores, mais lado B, da mitologia grega, tendo como seu domínio o ridículo, o deboche e o escracho. Momo, além de fazer uma pontinha em Hesíodo e em Platão, aparece na obra do fabulista Esopo, que narra o episódio em que ele acaba expulso do Olimpo por criticar a criação do ser humano. Enquanto isso, no Brasil, até hoje temos o costume de celebrar uma figura carnavalesca chamada de rei Momo.
Há um estranho silêncio em meio aos mitógrafos no que diz respeito a esse período entre a s ua expulsão do Olimpo e o naturalizar-se brasileiro. E o silêncio é território fértil para a imaginação febril. Num estilo verdadeiramente momesco, combinando referências mitológicas, literárias, esotéricas e de cultura de massa de um modo vertiginos o, Momo Rei narra o que teria acontecido enquanto isso, concebendo uma cosmologia que tem, em seu centro, o ridículo entronizado como o senhor deste mundo.
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Momo é uma arapuca, arrancada a carapuça dos prepúcios, de tudo que há, e ri em seu nome — o pai do deboche, também a burla que o nomeia. Um divino cariá, demônio doméstico na ponta da pena à cabeça, pernas pra quê? Te quero amar o risco na eureca que se ao cume inclina, o cume inflige danos — danação da escrita em sua profusão de mundos [velhos novos mundos, todos de invenção]. Vindo do Hades, ai ai, aquele bloco que nunca cessa de passar, balança mas não cai. Momo é a chacrinha dos nomes todos, também suas transações, o castelo ruidoso de cartas caindo, um quebra-cabeças de mil peças em branco quando sopradas pra fora da mesa. Natural de nós, que amamos deuses de importação, Momo é o plugue que nos alivia, de entrada e saída, do inferno perdulário da pecúnia, calunia as casas móveis, chamem a economia dos universos por criar. O balanço dos pratos na balança, um plano de equilíbrio pra terra plana [helás, quem nos livra o livro?], que nos empurra a dentro dos incêndios das referências. Momo é a inteligência improvável no terreno baldio da cultura, a sede inteira sed e pura na terra dos meme — dá de comer à terra grávida, enchendo do oco da boca ao olho do cu que nos olha e entrega os memo. Talvez caiba dizer que Momo, o livro, é: uma épica cômica, uma gargalhada delirante que pouco aparece na poesia brasileira,