Seja o ar da montanhaPara o sono dos cordeiros. Neve recém-caída,Puríssimo grão de açúcar,Duna sob a lua cheia. Tal qual o fruto da terraQue se dá a comer no sexto dia. Jazida inexplorada,Casa sem mobília,Vácuo do não-dito,Êxtase nunca interrompido. Tal como o olho cegoQue percebe o invisível,Gema de opalina. Seja o restante, o indiviso. Magma transmudado em cinza,Fóssil na noite da cripta,O vaivém milenar da água-viva,Líquido momento de sentirE estar sozinho. Mariana Ianelli produz silencio no leitor. Um silêncio que é cumplicidade e empatia, a identificação de uma memória em comum. A escritora refaz o passado com o refinamento de uma profecia, cria uma "arqueologia sagrada" de seus hábitos, desaloja verdades das aparên cias. Em sua poética singular e febril, cuidadosa e alentada, não há desperdício. Descobre o "rumor do oceano / no fundo de uma vasilha". Não existe propriamente o passado, o presente e o futuro, mas aparições, fulgurâncias de uma compreensão simultânea dos tempos. "Não há tempo que me fortaleça / Sem antes ter me derrubado." Seu olhar é de cima, como do alto de uma árvore, dos telhados, das costas de um anjo. Ela ensina a arte de perdoar, entende as imperfeições que pesam, problematizam e enriquecem a vida. "De todas as paixões do mundo / Resta-nos o dom de saber perde-las. "Não condena o sofrimento com castigos, culpas e maldições. O sofrimento é sábio e transmuda-se na alegria do autoconhecimento. Não pune abençoa com a partilha. Para cada aflição, indica uma receita curativa. Ao desespero, sugere "o consolo num copo de cidra". São poemas para a moldura da voz. Mariana tem uma vocação classicista para lapidar a dúvida em diamante. O adjetivo é bem colocado, os paradoxo s são necessários e os versos se perfazem em paralelismos bíblicos. Persegue a justiça e o equilíbrio da forma. Assim como Sophia de Mello Andresen e Maria Teresa Horta, grandes autoras de Portugal, condensa o raro em instantes de deslumbramento, des carna o mínimo com acurada intensidade, ultrapassa a vagueza pelo simbólico e adere ao território mágico das evidências. Se no outro lado "a eternidade é leve”, aqui, neste livro, a escrita ajuda a passagem da brasa ao cristal, do animal ao es pírito, do prosaico ao sacro. Dificilmente a poeta fala por si, na primeira pessoa. Recusa a catarse existencialista ou os achaques domésticos, fala com os outros (nunca pelos outros), em conjugação coletiva. "Gozamos um amor tranquilo, sem heroísmo.
Código: |
9788573212327 |
EAN: |
9788573212327 |
Peso (kg): |
0,000 |
Altura (cm): |
21,00 |
Largura (cm): |
14,00 |
Espessura (cm): |
5,00 |
Especificação |
Autor |
Ianelli, Mariana |
Editora |
ILUMINURAS |
Ano Edição |
2020 |
Número Edição |
1 |