A exemplo do que realizara em seu livro anterior - Primeiro segundo (1994) -, Ricardo Lima volta à carga tematizando os impasses relativos à percepção do tempo. Só que neste novo livro, Chave de Ferrugem, talvez a questão já não seja a da impossibili dade de fixar a experiência - a erótica sobretudo - em seu instante inaugural, ou, como indicava a ambigüidade daquele primeiro título, de observar com nitidez a passagem desse momento ao seguinte. Se lá o que estava em jogo era a difícil decantação do amor ("varrer do amor / o arroz, / um a um // despedida de amianto"), aqui o problema prende-se a um sentimento mais dilatado de impotência perante o tempo que escoa ou se acu-mula. Antes, o espanto vinha da defasagem entre a experiência e seu reg istro - "cadernos nunca ficam cheios (...) todo caderno velho / traz página não usada" -, agora, ao contrário, o que pesa é não provar "nunca mais nada pela primeira vez" Além de, por outro lado, sofrer-se a passagem dos dias como reiteração estéril: "na tela / continua / o que / não quero // amanhã / é manhã / de novo". Ou: "dias que quase não terminam / do outro lado desta / mesma lesma vida".
O corpo acede ao primeiro plano, não mais como receptáculo de "beijos ampu-tados" ou fronteira "à beira de um toque, / céu e dúvida". O poeta, antecipando-se aos perigos que moram "nel mezzo del cammin di nostra vita", adverte os acha ques da idade: "trinta anos, a medida" "neve azul a idade / tomando os olhos" "com a idade / atenção ao corpo / / ossos se colocam / cicatriz brota de uma perda".
Há, como era de se esperar, referências à morte (alheia e própria pontuando os poemas, mas sem a grandiloquência muita vez associada à gravidade do tema. Afi-nal, Ricardo escreve "sem tendência pr a tenor (..) nem olhos no infinito". Sua sintaxe é seca e veloz sua dor, sem trejeitos,"sem sobrenome". Não há vocábulos raros, interjeições dramáticas, colorações noturnas ou truques do gênero.
Há também, ainda em comparação com o livro anterior , um diálogo maior entre os espaços externos (a rua e a paisagem de um modo geral) e o espaço doméstico.
A casa, cenário de vários poemas, não possui mais janelas fechadas ou portas emperradas contendo a presença da rua, mas é, toda ela, "aberta na manhã". Suas paredes, como um corpo, suportam desgaste, seus móveis acumulam pó e guardam cheiros por intermédio dos quais o passado entra e a família navega. Os sons de fora - "bicicleta rouca / vilarejo e multidão", o sino oculto no céu a convocar
Código: |
9788586372124 |
EAN: |
9788586372124 |
Peso (kg): |
0,000 |
Altura (cm): |
18,00 |
Largura (cm): |
12,00 |
Espessura (cm): |
0,50 |
Especificação |
Autor |
Ricardo, Lima |
Editora |
NANKIN EDITORIAL |
Ano Edição |
1999 |
Número Edição |
1 |