DOS BICHOS: AGENTES E GENTES
Podemos alinhavar logo estas observações saltando indevidamente o “Prólogo” das alternativas e escorrer o olhar pelo início e o fim do livro. Deve ficar claríssimo que o “Prólogo” muito merece ser lido. Mas certa táti ca de momento obriga a ver que o primeiro não-texto absoluto é história do cão, em branco. Sem texto, só uma epígrafe anterior. Isto faz o leitor alertar-se sobre um eventual erro de editoração. O último é um semitexto, um não-texto quase, com uma só linha escrita, que parece expor a nu o homem. Expor a nada e a tudo, como o mito de Fernando Pessoa, já que é apenas um último resíduo no conjunto da bicharada.
Dito isso, antes do miolo do livro, convém certo conforto ao leitor sobre o título d o volume, bem enigmático, mas esclarecedor: zoografia é a descrição ou desenho de bichos ou animais. Está no dicionário. Zooalgia, contudo, é montagem de bicho com dor, dor de membro ou do corpo. E aí está: há dores nos bichos, até muita dor, fato a que os humanos pouco atentam, preocupados em geral apenas com suas próprias dores. Magnífica lição de sensibilidade mais que humana do autor.
Os dez textos que formam o miolo escrito e de fôlego são narrativas – contos, quase-contos, protocontos – que desafiam a leitura, sem se quadrarem em quase nada de gênero literário convencional, mas com invenção contínua e expressão de linguagem para gerar e construir personagens e acontecimentos extravagantes e excêntricos e, às vezes, monstruosos, co mo o peixe desmarinado e desarvorado. Tudo na tradição do grotesco.
Curiosamente, entretanto, não se formam alegorias específicas, nem gerais, porém tudo nessas narrativas é animal e também humano, inseparavelmente.
Quando os rinocerontes fil osofam sobre o idealismo alemão dos séculos XVIII e XIX e suas repercussões até o século XX, isso é para ser levado a sério ou está montada uma astuta farsa, como o paradoxo do mentiroso e arredores? O leitor que se decida, se isso for possível. E quando uma tartaruga bem velhinha – as tartarugas vivem muito, são longevas – internada no asilo padece de loucura senil ou do mal de Alzheimer, ela é acompanhada com extrema e comovente empatia e sensibilidade, como a desvelar o destino comum dos humanos muito idosos.
Lendo este livro extraordinário há muito mais para o leitor espantar-se e considerando que seu autor, que é também músico, escreveu-o aos 22 anos (hoje conta 23), trata-se de acontecimento literário e humano de fazer cair o
Código: |
9788577511204 |
EAN: |
9788577511204 |
Peso (kg): |
0,000 |
Altura (cm): |
21,00 |
Largura (cm): |
14,00 |
Espessura (cm): |
0,70 |
Especificação |
Autor |
De, Souza |
Editora |
NANKIN EDITORIAL |
Ano Edição |
2017 |
Número Edição |
1 |