Este livro, como seu título anuncia, investe na originalidade e diferenciação para reinterpretar a obra de Machado de Assis. Conhecedora da ampla, rica e variada tradição da crítica machadiana, desde os contemporâneos do grande escritor até a nossa a tualidade, a autora percorre os grandes temas, assuntos e problemas postos e em andamento para reler e não poucas vezes desler o que veio, de longe ou de mais perto, e anda por aí.
Por exemplo: recuperar uma arte poética formulada por Machado em d iversos textos críticos (sobre literatura, teatro etc.) e conferir, a partir daí, o que ele fez e ultrapassou seu meio e seu tempo. Nesse espectro, pelo menos dois grandes movimentos de revisão estão em cena: a) seria Machado, de fato, um escritor re alista? Segundo quais critérios ou categorias estéticas de realismo seria possível afirmar um “realismo” machadiano, mesmo “mitigado”? b) o que comprovaria uma espécie de “verdade assentada”, quase um chavão ou estereótipo crítico, segundo o qual Mac hado é um pessimista? Não estaria aí embutida na repetição cansativa e sem melhor análise uma mera falácia crítica, cujo exame detalhado desmente?
Em andamento semelhante, a partir do exame interno das implicações da célebre Caixa de Pandora, chav e para interpretação do capítulo do “Delírio”, das Memórias póstumas de Brás Cubas, a autora busca uma caracterização original das relações entre cultura e natureza no romance machadiano, com repercussões fundamentais na “teoria do Humanitismo” de Qu incas Borba, tanto nas Memórias póstumas quanto naquele romance homônimo, e, quem sabe, também nos romances posteriores.
Ao mesmo tempo, sem escorregar na noção universalista e trans-histórica de gênero literário, a autora examina minuciosamente a tradição da sátira menipeia em variados autores europeus, desde o século dezesseis, analisando-os e interpretando-os, a demonstrar a familiaridade e os diálogos machadianos com esses autores e essa tradição.
No quarto capítulo deste livro desafia dor, Élide Valarini debruça-se sobre Dom Casmurro para pôr em questão o viciado problema do narrador não confiável, ou, alternativamente, como está discutido, “subjetivo mas confiável”. É uma bela, rica e complexa discussão.
Finalmente, no quinto capítulo é retomada uma renovada reavaliação da poesia de Machado de Assis, seus diversos e contraditórios processos, o lírico, o elegíaco, o indianista, o histórico, o paródico etc. e, ainda, o lugar da poesia machadiana em nossos tempos atuais.